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Irregularidade é ainda mais comum entre propriedades rurais, indicam especialistas


Entre invasões e imóveis populares ou de luxo, o mercado imobiliário brasileiro enfrenta um histórico problema com as escrituras imobiliárias. São cerca de 40 milhões de domicílios urbanos sem o documento. A situação é a mais comum entre as irregularidades nas moradias brasileiras, que atingem 60% dos domicílios, segundo informações do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional. Para o proprietário, as consequências podem ir desde a desvalorização e dificuldade de vender o imóvel até o risco de perdê-lo.

A escritura pública de um imóvel é um documento lavrado em Tabelionato de Notas, que formaliza a transação imobiliária. Ele contém informações detalhadas sobre o imóvel, as partes envolvidas e a compra ou doação. De acordo com a legislação, o documento é essencial para a validação de transações com valor superior a 30 salários mínimos.

Presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis da Bahia (Creci-BA), Nilson Araújo alerta que a falta da escritura não se restringe apenas a imóveis de bairros periféricos, em toda a cidade existem domicílios nesta situação, inclusive nas regiões consideradas mais nobres. Nazaré, Pituba, Itapuã, Boca do Rio e Amaralina, por exemplo, merecem uma atenção redobrada quando o assunto é documentação irregular. Isso porque, segundo o presidente do Creci, essas são regiões onde existe uma incidência maior de imóveis gravados com enfiteuse (arrendamento por longo prazo ou perpétuo), o que gera diferentes obrigações ao proprietário e pode acabar contribuindo para que o imóvel fique irregular.

O advogado e assessor jurídico do Creci, Wendell Leonardo, acredita que, em áreas mais nobres, a falta da escritura pode estar relacionada a disputas de terras, especulação imobiliária ou complexidades legais ligadas à propriedade, como é o caso de imóveis gravados. “Já em regiões populares, a situação, muitas vezes, está associada a questões de pobreza, acesso limitado a recursos legais e dificuldades burocráticas”, lista o advogado.

O custo para a regularização também costuma ser, segundo Wendell, um motivo para permanecer na irregularidade. É preciso arcar com o valor para o lavramento da escritura e o pagamento do imposto de transmissão do bem. Podem contribuir ainda a falta de conhecimento e o fato do imóvel já ter sido adquirido anteriormente com documentação irregular.

“Muitas vezes, a falta da escritura acontece por que a compra foi feita com contrato de gaveta, particular, que é redigido e assinado pelas partes, mas sem a intervenção de um órgão público oficial. Esse é um contrato que não é tão seguro quanto uma escritura pública. O ideal é sempre a escritura pública”, afirma o presidente do Creci.

Advogada especialista em direito imobiliário, Fernanda Andrade acredita que entre os domicílios rurais a incidência de irregularidades ou falta da escritura deve ser ainda maior. Primeiro, porque as transações de compra e venda desse tipo de imóvel são, segundo Fernanda, menos frequentes, então eles acabam ficando irregulares por gerações. Depois, porque nas áreas rurais é comum as pessoas só confiarem umas nas outras e resumirem a venda apenas à entrega da chave. Fernanda chama atenção ainda para a possibilidade de ser ainda mais difícil regularizar esse tipo de imóvel, já que muitos deles estão próximos de áreas de conflito rural ou proteção ambiental. E essa irregularidade pode trazer problemas como a dificuldade na aquisição de financiamentos para atividades agrícolas.

Na verdade, não basta ter a escritura. O que importa mesmo é o registro desse documento em um cartório de imóveis. Em Salvador, eles são sete e se dividem abrangendo cada um uma região da capital. Segundo a advogada, mesmo que o comprador já tenha realizado o pagamento pelo bem, sem o registro da escritura em um desses cartórios, ele não é formalmente o proprietário do imóvel.

“E isso pode causar enormes prejuízos, como a venda em duplicidade pelo antigo proprietário a outra pessoa ou a penhora do imóvel por credores do antigo proprietário, que, sem a escritura registrada no cartório de imóveis, não tinham como saber que o imóvel já havia sido vendido”, esclarece Fernanda.

Desvalorização do bem

Além disso, a casa ou apartamento sem escritura registrada pode sofrer desvalorização. Isso porque, segundo a advogada, quem tiver o interesse de adquirir o bem vai saber que precisará regularizar a transação anterior, para só então fazer o registro da sua compra. “E quanto mais tempo a pessoa demora para regularizar essa situação, mais riscos ela corre, porque o antigo proprietário pode falecer ou desaparecer, dificultando a regularização”, alerta.

Qualquer outra pendência ou desencontro de informações no cadastro também podem tornar a situação do imóvel irregular, lembra a especialista, que garante que isso é muito mais comum do que as pessoas imaginam. Um exemplo citado por ela é quando uma pessoa solteira compra um imóvel, lavra a escritura e registra no cartório. Depois, se ela se casar e não levar essa informação à matrícula do imóvel no cartório, essa se tornará uma pendência que em algum momento deverá ser sanada. 

“Há também casos mais complexos, como quem tem um imóvel cuja descrição física no cartório de imóveis é redigida de forma precária a ponto de não ser possível localizá-la mais no espaço rural ou urbano com precisão.  E há também a recorrente situação de compra de imóvel só com recibo, sem contrato, sem escritura pública, que é uma irregularidade mais conhecida do público”, elenca a Fernanda.

Para evitar cair na irregularidade, o assessor jurídico do Creci orienta que os proprietários não deixem de obter todas as licenças e autorizações na hora de fazer reformas ou construções, elas, inclusive, precisam ser averbadas no cartório. É importante ainda, segundo o especialista, estar atento ao que é permitido e o que não é na zona do imóvel. Se a região, por exemplo, for uma área de preservação ambiental, existirão algumas restrições. 

Já para quem pretende comprar um imóvel e quer fugir de irregularidades, o advogado acredita que a palavra-chave deve ser cautela. É preciso analisar toda a documentação do bem e das pessoas envolvidas na transação, desde a certidão de matrícula da casa ou apartamento até dívidas de impostos ou taxas, certidões judiciais e do fisco. Além disso, um advogado especializado em direito imobiliário e um corretor podem ajudar na negociação e verificação da documentação.

“No momento de adquirir um imóvel, a certidão atualizada da matrícula do imóvel é, sem dúvida, o documento mais importante a ser analisado. É neste documento que verificamos, por exemplo, se o vendedor é realmente o proprietário do imóvel, se a configuração e dimensões do imóvel correspondem àquelas constantes do registro imobiliário, se existe alguma cláusula restritiva e etc”, explica.

Fonte: A Tarde

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