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Área do Associado

* Fábio Pinti Carboni

Professor universitário; advogado; associado do IBDFAM 

Em 26 junho próximo passado, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu que a Corregedoria-Geral de Justiça de cada estado deve proibir aos tabelionatos de notas a lavratura de escritura pública contendo declaração de união poliafetiva.

O fundamento principal de tal entendimento foi o de que as uniões entre 3 ou mais pessoas de modo simultâneo e sob o mesmo teto não recebem amparo da sociedade contemporânea e nem permissão do ordenamento jurídico, ferindo o princípio da monogamia inerente aos arranjos familiares.

Mas, afinal, o que é o poliamor? Entende-se por aquele relacionamento afetivo duradouro, entre 3 ou mais pessoas simultaneamente e sob o mesmo teto, com identidade de interesses e objetivos e independentemente do sexo, gênero ou orientação sexual de cada um.

Já se sabe que a constituição de família entre 2 pessoas pode se dar das mais variadas formatações, seja entre homem e mulher, entre homens ou entre mulheres, tanto pelo casamento quanto através da união estável.

Todavia, quando se fala em união poliafetiva, a sociedade, arraigada em preceitos culturais conservadores, tende a discriminar os seus integrantes e a repudiar tais núcleos, assim acabando por estabelecer critérios e padrões rígidos na busca pela felicidade individual, em verdadeiro controle (quiçá indevido) dos relacionamentos alheios.

Importante lembrar que tal união não se confunde com a relação adulterina estabelecida às escondidas, pois naquela todos convivem conjuntamente e sob o mesmo teto, estando acordes com o estabelecimento de afeto de maneira plural e recíproca, havendo cumplicidade e identidade de interesses.

Voltando à decisão do CNJ, há quem a repudie por configurar afronta à liberdade e dignidade de cada cidadão em decidir quando e com quem se estabelecer amorosamente, no exercício da opção de escolher a maneira de alcançar o bem-estar e a felicidade, sem lesar direitos de terceiros.

Será que o CNJ quis avançar para impedir não só a lavratura de escritura de união poliafetiva, mas também externar a sua oposição a tais relacionamentos? Será que é medo e resistência ao novo? Ao que parece, a resposta é positiva.

Mesma discussão já houve com as uniões entre pessoas de mesmo sexo, com acalorados debates jurídicos e sociológicos, até que em 2011 foram reconhecidas como entidade familiar pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Será que proibir lavrar escritura pública impedirá que tais uniões existam?

Ou pode se falar em censura e cerceamento à liberdade de expressão e de sentimento?

Em tempos de debate inflamável no Judiciário, com inegáveis tremores na segurança jurídica, pode-se afirmar que o CNJ acabou por adentrar na apreciação de tema que não lhe compete, ainda que pela via oblíqua, engessando a evolução das relações familiares.

Vale dizer que a escritura pública, por si só, não ofende o direito positivado, uma vez que inexiste qualquer norma expressa que impeça tais declarações, até porque a escritura, nestes casos, não tem o condão de criar direitos, mas sim o de reproduzir a declaração de vontade das partes sobre determinado fato.

Aliás, a manifestação do afeto é ínsita a todo ser humano, competindo ao Judiciário analisar, no momento oportuno e se for o caso, se determinados arranjos configuram, ou não, núcleo familiar, tendo o CNJ antecipado tal atividade.

Não se pretende incentivar qualquer crise social e nem familiar e muito menos rotular os relacionamentos, mas apenas lembrar que a palavra de ordem é RESPEITO – respeitar quem quer viver a 3 (ou mais) e fez desta opção o lema para ser feliz, na mais ampla acepção da palavra.
Como canta Lulu Santos, “consideramos justa toda forma de amor”.

Fonte: IBDFAM

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