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CRIMES

Limite entre a liberdade de expressão e as agressões online está sendo determinado por meio de ações judiciais; saiba como denunciar os casos

Liberdade de expressão e de opinião, sim, você tem. Mas a partir do momento que a manifestação do seu pensamento, inclusive nas redes sociais, atinge a honra, imagem, intimidade ou privacidade de alguém, o caso muda de figura e pode resultar em um processo judicial ou ata criminal, dependendo do teor do conteúdo compartilhado.

No Amazonas, há vários exemplos de condenação. O mais recente aconteceu em agosto deste ano quando o Juizado Especial Cível da Comarca de Manaus condenou uma paciente a pagar R$ 10 mil de indenização por dano moral a um médico que ela havia ofendido por meio de uma publicação em rede social. Na decisão, o magistrado afirmou não haver dúvida de que a mulher “extrapolou o limite da liberdade de expressão e de opinião”.

Dois meses antes, a Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM) negou recurso de uma rede social contra uma mulher que havia conseguido uma decisão liminar de 1º grau determinando que a empresa revelasse todos os dados do criador de contas com perfis falsos em seu nome, que a prejudicaram.

A advogada Luziane Figueiredo, doutoranda em Direito Constitucional, explica que no caso de violação dos direitos da personalidade (à honra, à imagem, à intimidade e à privacidade), a vítima pode ajuizar basicamente dois tipos de ação: a criminal e a civil. A primeira é resolvida nos juizados especiais criminais com a proposta de transação feita pelo Ministério Público e a vítima não recebe nada do autor da agressão.

“Nesse caso, o autor da difamação ou da calúnia, por exemplo, faz uma espécie de acordo para prestar serviços à comunidade ou para fornecer cestas básicas a uma instituição, ao mesmo tempo em que se compromete a retirar a postagem e a não violar mais o direito da vítima, entre outras condicionantes que pode constar na transação, dependendo de cada caso”, explica a especialista.

Já na ação civil, a vítima vai ao Judiciário buscar uma indenização em dinheiro (até 40 salários mínimos) para a violação que entende ter sofrido. Nesse caso, a vítima pode requerer danos materiais, se houver, e danos morais. “Apesar de ser a ação mais comum, há uma grande discussão acerca da satisfatividade das condenações”, destaca a advogada.

“Imagine você que diante de uma violação da honra, da intimidade, da privacidade e da intimidade, como tem ocorrido no caso de vazamento das famosas nudes, dinheiro nenhum irá ser suficiente para reparar a dor sofrida pela vítima, ainda mais se levarmos em consideração que a repercussão das mídias sociais é inimaginável; que aquela violação permanecerá na rede eternamente, etc”, observa.

Em números: 48 processos estão em trâmite apenas contra o Facebook, de acordo com pesquisa rápida ao site do TJ-AM, em consulta de 1° grau, feita por Luziane Figueiredo. Nos dez primeiros meses deste ano foram registradas 1.121 ocorrências de crimes cibernéticos no Amazonas, de acordo com a Secretaria de Segurança (SSP-AM). Um aumento de 16,8% em relação ao mesmo período de 2016.

Traumas podem ser severos

A psicóloga Luziane Vitoriano afirma que os efeitos do cyberbullying – agressões feitas por meio de recursos eletrônicos – na vida de uma vítima vão desde o isolamento social ao aumento de níveis de sintomas de depressão, tentativas de suicídio e autodestruição. “O uso seguro de tecnologia deve ser estimulado desde muito cedo na vida das crianças na atualidade”.

Uma estudante amazonense de 19 anos que foi alvo de diversos comentários, inclusive ofensivos após ter um vídeo em que perde uma prova, por confundir o horário de sua aplicação, publicado na internet disse que algumas publicações deixaram-na extremamente abalada. “Enquanto compartilhavam e riam da situação eu preferi me isolar, faltei aula, ignorei pessoas, tudo para não ter que lembrar o acontecimento”. Contudo, ela não denunciou nenhum comentário.

Como denunciar: em caso de crime virtual envolvendo calúnia, injúria e difamação, a vítima deve fazer print do site ou grupo de conversas e, a fim de resguardar a prova, tem se dirigir ao cartórioe solicitar a transcrição do conteúdo, além de registrar Boletim de Ocorrência (BO) no Distrito Integrado de Polícia (DIP) mais próximo da sua casa ou do local em que o fato ocorreu. No Amazonas, o número de atas notariais, documentos lavrados nos tabelionatos que compravam crimes na rede, saltou de 25 em 2006 para 311 em 2016, crescimento de 1144%, em dez anos, de acordo com dados do Colégio Notarial do Brasil .

Ninguém é anônimo na Internet

A advogada Luziane Figueiredo ressalta que todo aparelho eletrônico possui o denominado IP, que é o endereço eletrônico. No entanto, essa busca pelo IP só é feita pela polícia, numa investigação criminal, o que demanda tempo. “Os sistemas de investigação e de justiça ainda são muito lentos para brecar, para minimizar os danos causados à personalidade”, apontou.

Ela, que é autora do livro “Crimes Contra os Direitos da Personalidade na Internet – Violações e Reparações de Direitos Fundamentais nas Redes Sociais”, cita como exemplo uma decisão contra uma rede social, que demora pelo menos seis meses para ser cumprida. Enquanto isso, a postagem continua a cada segundo ferindo o direito da vítima.

Luziane salienta que ao longo da história nos preocupamos com o “ter”. “Os juízes de seus computadores conseguem bloquear uma conta corrente, através do sistema Bacenjud, que interliga todos os bancos ao Banco Central; conseguem bloquear bens, através do Renajud, mas não conseguem bloquear uma página, ou frear uma viralização de imagens e vídeos nudes, por exemplo, no Whatsapp”.

A advogada reconhece que como a Constituição Federal assegura a liberdade de manifestação, uma postagem só pode ser bloqueada dentro do devido processo legal. Mas, para ela essa estrutura jurídica (necessária) demanda tempo, enquanto que o direito violado vai sofrendo ainda mais com a delonga.

Ela destaca que na Itália foi criado uma espécie de Tribunal Administrativo no qual as pessoas podem denunciar postagens criminosas e, um colegiado de pessoas, analisa e propõe as medidas necessárias. No Brasil, há Projetos de Lei (PL) tramitando nas duas casas do Congresso Nacional que visam a proteção de dados e também prevêem a criação de Conselhos de Regulamentação.

“Mas, enfim, a Internet tem que ser livre sempre, ela não pode se deixar aprisionar. Esse princípio de liberdade é essencial para a criação e consolidação de uma nova democracia!”, afirmou.

Fonte: Jornal A Crítica

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